OBRA:
Quarto de Despejo: diário de uma favelada/Carolina Maria de Jesus; ilustrações de No Martins. -- 1ed. -- São Paulo: Átila, 2020. 264 p. Edição comemorativa.
PERCEPÇÕES PESSOAIS SOBRE ESSA OBRA:
O que me impressiona aqui é a fome como protagonista da sua obra, e a saúde mental afetada por essa "protagonista que rouba a cena sem ser convidada". Por diversas vezes, a autora menciona que tinha vontade de suicidar-se e viu diversos favelados passarem por esse desfecho:
"Ela disse-me que já está com nojo da vida. Que não vê a hora de morrer.
Ouvi seus lamentos em silêncio e disse-lhe:
- Nós já estamos predestinadas a morrermos de fome!". PG 132
Já a autora padece desse mesmo mal:
"(...) Hoje acordei não temos nada pra comer. Queria convidar os filhos para suicidar-nos. Desisti. Olhei meus filhos e fiquei com dó. Eles estão cheios de vida. Quem vive, precisa comer. Fiquei nervosa, pensando: será que Deus esqueceu-me? Será que ele ficou de mal comigo?". PG 161
(...)
Essa obra a meu ver é atemporal, e nos convida a refletir sobre a miséria e como ela afeta a saúde mental dos que estão à margem ainda nos dias atuais. ..
A autora em alguns trechos da obra se deprime e em "outros ela canta", canta principalmente quando a sua panela fica cheia e pode em raros momentos "matar à fome" dos seus filhos.A minha impressão como escritora e artista múltipla é que Carolina de Jesus só não enlouqueceu ou morreu de fome porque "a escrita a alimentava".
FICA A REFLEXÃO:
Será que o Brasil se preparou mesmo para "libertar os seus escravos" ou apenas incutiu-lhes condições semelhantes após a abolição?
Como vamos acabar com a violência, se os que estão à margem vivem miseráveis, e irritados devido aos efeitos colaterais da fome.
Será que o Estado cuida da saúde mental dos (in)visíveis sociais, e quer mesmo os guardar e os proteger enquanto cidadãos de direitos?
A favela também escreve!
Sigo apaixonada pela literatura!
Indicação de 📚 leitura
QUARTO DE DESPEJO: DIÁRIO DE UMA FAVELADA, de Carolina Maria de Jesus #carolinadejesus
Provocações:
Será que temos que ter o melhor português e estarmos vinculados a uma instituição acadêmica para sermos intelectuais?
Será que o conhecimento acadêmico é melhor que a sabedoria popular?
Por que uma obra best seller foi considerada durante anos como uma literatura inferior?
"Eu disse para a Dona Maria que ia para a televisão. Que estava tão nervosa e apreensiva. As pessoas que estavam no bonde olhavam-me e perguntavam-me: é a senhora quem escreve?
Sou e.
- Eu ouvi falar.
Ela é a escritora vira-lata, disse a Dona Maria mãe do Diogo. Contei-lhes que um dia uma jovem bem vestida vinha na minha frente, uma senhora disse:
- Olha a escritora!
O outro ajeitou a gravata e olhou a loira. Assim que eu passei fui apresentada.
- Ela olhou-me e disse-me:
- É isto?
E olhou-me com cara de nojo. Sorri, achando graça.
Os passageiros sorriram. E repetiam. Escritora vira-lata" (PERPÉTUA, 2000, p. 332).
Fica a dica de leitura! 📚
Por Thaís Alessandra/@thais.alessandra_