quinta-feira, 30 de novembro de 2023

Das Cinzas da Senzala, O Levante.

Percepções pessoais e sensações sobre a obra de Adriana Santana, "Das Cinzas da Senzala, O Levante":


O romance Úrsula de Maria Firmina dos Reis foi o primeiro romance a me afetar dentro dessa temática, pois trazia a óptica dessa autora que viveu no século XIX e deu voz as dores dos negros escravizados por meio da sua obra, em uma época em que eles não tinham voz.  Maria Firmina dos Reis me fez sentir, mais do que compreender, sentir as  próprias vivências de desumanização que essas pessoas tragas a força da África para o Brasil viveram ao serem escravizadas em terras "além mar", mas segundo o "olhar deles" e não como foi contado para nós através da história. 


Em analogia a esse grande romance do século XIX, apresento a obra "Das Cinzas da Senzala, O Levante", romance premiado em 1o. Lugar - Prêmio Maria Firmina de Literatura - Novos Autores 2021, que a meu ver também (des)silencia aqueles que não tinham voz naquela época. Além disso, todos os elementos da cultura afro-brasileira que foram descritos nessa obra foram relatados com tanta maestria, quase que de forma poética, emocionando "a leitora que se questiona se aconteceu mesmo o que está sendo narrado na obra". 

 
Do início ao fim, a gente sente o levante acontecer, e a esperteza da guerreira Njinga, do Pai João e de todos os negros da senzala que usavam a língua nativa para se protegerem, pois só eles entendiam aquela língua que os brancos da Casa Grande não compreendiam, e como eles eram constantemente vigiados, a língua era uma forma de comunicação para eles seguirem rumo a liberdade sem serem percebidos.

Impressiona-me nessa obra a ligação da menina guerreira Njinga com o Pai João, que ultrapassa a morte, pois ele sempre a guiava e aparecia para ela em diversos momentos. A espiritualidade aparece na obra quase que como um outro personagem, sendo temida pelos da Casa Grande, que tinham muito medo desse lado dos negros escravizados, sendo atribuída por eles como feitiçaria. Mas, ela era também uma forma de proteção, em diversos sentidos, e por causa desse medo dos brancos, o Pai João foi ouvido pelo Jerônimo, personagem que confesso ter tomado ódio no decorrer da obra, "ôh, sinhozim odioso!".

A ginga, a língua, os negros da terra, a espiritualidade, a lua que separava o tempo para que o levante acontecesse; o assobio que conduzia a Njinga a mata, direcionando a menina em direção aquele som até encontrar a sua mãe; e os cânticos introduzidos quando algum personagem negro "atravessava o rio (morria)", tudo tem poesia nessa obra.

Além da obra inteira, dois trechos me marcaram bastante: quando Njinga tem que raspar as suas tranças, que traziam memórias do Pai João que ao trança-la contava histórias. Mas, a trança foi raspada para que ela fosse marcada como escrava do Jerônimo. O segundo trecho, foi quando a menina nasce e a mãe Benedita manda que ela beba o leite rápido porque iria ser dado a menina branca, o que imagino ter sido muito difícil para a maioria das mães pretas daquela época.

Contaram para Njinga que sua mãe Benedita foi morta no tronco, e a garota retoma o contato após voltar para a Casa Grande e descobre que sua mãe estava viva na mata junto aos negros da terra, pois teve que se esconder por lá durante anos para sobreviver.

O final nos surpreende ainda mais, leiam a obra e descubram quando o canto da liberdade foi entoado entre os negros da senzala.


Resenha feita pelas sensações vivenciadas por mim enquanto leitora dessa obra.

Thaís Alessandra